Esta ousadia, para muitos, pode parecer inacreditável, mas aconteceu. Seu autor: Cicero Leuenroth, uma lenda de nossa Propaganda, meu primeiro patrão. Cicero foi, talvez, o mais consagrado tycoon de nossa Propaganda. De extrema simpatia, voz forte, personalidade marcante, construiu a fama e a imagem da Standard Propaganda, que ele fundou em 1933, após brigar com o pai, Eugenio Leuenroth.
Cicero tinha a Propaganda no sangue, pois seu pai fundou com João Castaldi em 1914, em São Paulo, a primeira agência brasileira, a Eclética. Com seu estilo pessoal, Cicero conquistava contas com um charme surpreendente e com precisão estratégica. Por exemplo, para pegar a conta da Shell, o Cicero comprou a Tupã, pequena agência que atendia aos ingleses e fez isso logo que a Segunda Guerra acabou.
Colgate Palmolive era cliente da Standard. E patrocinava as famosas novelas que a Rádio Nacional transmitia, com audiências fantásticas, antes do surgimento da TV. Acontece que muitas emissoras de Rádio do interior solicitavam à Standard que a Agência enviasse os capítulos que elas retransmitiriam localmente, dando crédito à Colgate e tirando partido do prestígio de porem no ar uma novela de sucesso, gravada no Rio de Janeiro, por um cast famoso de rádio-atores e rádio-atrizes. O Cicero montou um “estúdio de som” para cumprir esta logística. Curioso: os discos com os capítulos iam pelo Correio para as emissoras de outros estados. As vezes, um capítulo mais adiantado chegava na frente de um anterior… Já imaginou?
Na década de setenta, Cicero Leuenroth, vendeu, definitivamente o controle da Standard Propaganda para outro lendário ícone, David Ogilvy.
Aprendi muito com o Cicero; o pessoal da Standard o chamava de Pajé.
Em 1960, eu estava na PUC, no primeiro ano de Jornalismo e pedi ao Prof. Evaldo Simas Pereira, responsável pela cadeira de Teoria de Imprensa, que me conseguisse um estágio em Jornal. O professor Simas Pereira, que era homem de Relações Públicas da Companhia Siderúrgica Nacional, colocou um cartão de visitas no meu bolso e disse que eu deveria procurar o Guilherme Augusto de Vasconcellos, que era o Supervisor de Operações da Standard Propaganda, trazido da McCann pelo Cicero Leuenroth.
Se vocês pensam que conseguir estágio na época era moleza, não era bem assim.
Cheguei à Agência às 8h e meia de uma segunda, de terno e gravata (tinha comprado meu primeiro terno na Barky Roupas, na Avenida Rio Branco, hoje é uma loja do McDonald’s).
Eu tinha 19 anos e o Guilherme me mandou voltar no dia seguinte, sempre pela manhã e ainda me mandou voltar no dia seguinte.. .e no dia seguinte…. até que na sexta-feira, finalmente, me entrevistou e me deu o estágio, porque tinha “percebido o meu interesse”, palavras dele.
E a estória do sabonete que eu ia contar?
Dizem que numa concorrência organizada pela Colgate Palmolive para escolher uma nova Agência, no dia em que as Agências se apresentaram para serem brifadas, o americano, presidente da empresa e senhor todo-poderoso, começou a reunião dizendo que o sabonete dele era feito com o mais puro azeite de oliva.
O Cicero Leuenroth não perdeu tempo: pegou um dos sabonetes que estava em cima da mesa, mordeu com força, mastigou com vontade e concluiu: realmente, é azeite de oliva, com certeza. Ganhou a conta neste momento!
Cicero Leuenroth “importava” talentos americanos para trabalhar na Standard. Em 62, trouxe dois homens de criação dos Estados Unidos: Wallace Dale Pucket e Glenn Kittelson. Até hoje me lembro do consagrado Evandro Barreto, em início de carreira, já brilhante redator na Standard, ensinando ao Glenn como pedir feijoada nos restaurantes:
“—é fácil, Glenn, ensinava o Evandro, basta você dizer que quer comer fish water, entendeu?”
Em 1961, ouvi o nome do Roberto Duailibi pela primeira vez. Ele era redator na Standard de São Paulo. Eu trabalhava no Atendimento no Rio. Sem que nos conhecessemos ainda, disputamos um Concurso organizado pela International Advertising Association, que mandaria o vencedor do Brasil para um Congresso de Publicidade em Paris naquele ano. Não preciso dizer que foi o Roberto, entre os dois únicos concorrentes brasileiros, quem venceu!
O que aprendi com o Cicero foi por osmose, porque ele não podia dar muita confiança a um novato em Atendimento, com pouco mais de 20 anos. Duas, três vezes por semana, eu voltava de tarde da Bolsa de Valores e passava para o Cicero as inside information que o Marcello Leite Barbosa, nosso cliente, dono de uma Corretora, me entregava de bandeja, do tipo: vende Petrobras, compra Belgo, segura Samitri, espera a bonificação. O Cicero adorava minhas dicas, adotava novas posições de compra e venda de ações e dizia: aí garoto, bom trabalho!
Numa daquelas tardes, olhou firme para mim e disse: “vou te dar um conselho, você vai se casar agora (estávamos em 1962) e pode ser que, de alguma forma, isto lhe seja util: quando você estiver sem dinheiro, atravessando uma fase difícil, dá uma festa!”
Impossível esquecer quem foi Cicero Leuenroth…
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