Desde julho do ano passado, diariamente, entre segunda e sexta, saio do Catete e me dirijo a Bonsucesso, onde integro a Gerência de Comunicação e Marketing da UNISUAM.
Isto acontece, na maioria das vezes, entre 8h30min e 9h30min e vou de metrô até a estação Triagem. Lá pego o trem da Supervia, ramal de Gramacho, que me deixa minutos depois em Bonsucesso.
Nestes últimos nove meses, tenho convivido com um grupo muito heterogêneo de vendedores autônomos de todos os tipos.
São centenas de homens e mulheres, alguns bem idosos, outros adolescentes, algumas jovens grávidas, outros tantos com algum tipo de deficiência física. Enfim, são conterrâneos nossos, lutando, cada um a seu modo, pela sobrevivência diária. Não são pedintes e seria pouco chamá-los simplesmente de camelôs.
São batalhadores anônimos que encaram o que é chamado de Shopping Trem da Supervia.
Quando volto da Unisuam, entre às 14 e 16 horas, vindo de Bonsucesso à Central, encontro-os de novo na mesma faina de vender tudo o que você pode imaginar: empadas, cocadas da Bahia, água mineral, lâminas de barbear, escovas de dente, mangueiras com dezenas de metros de extensão, toda uma parafernália de itens para telefones celulares. Os preços são muito baixos comparados com o preço normal dos produtos vendidos no comércio.
A maior parte deles é bem articulada, expressam-se com fluência, demonstram bom humor e otimismo e apregoam seus produtos com uma alegria quase juvenil.
No jargão que praticam há uma expressão bem comum, sobretudo quando o produto tem preço irrisório. Eles dizem: “me paga um real”. Basta isso para você pegar uma cocada gostosa, um saco de pipocas, um pacote de balas….
Tem uma senhora, aparentemente com não mais de 50 anos, que vende mariolas que chama de “bananão” e que custam, cada uma, apenas 50 centavos.
Um dia fiz, um calculo por baixo e cheguei à conclusão de que aquela senhora para conseguir fazer uma receita diária bruta de 50 reais precisa vender, no mínimo, 100 mariolas. Considerando que ela compra as mariolas para revender, se ela conseguir 20 reais por dia, é uma batalha.
E mais: eles ficam nos vagões circulando até nove da noite e talvez mais, porque pegam o pessoal voltando para casa. Não todos, mas alguns trabalham nos fins de semana. Precisei ir à faculdade num sábado e lá estavam eles. Em menor número, mas firmes no batente.
Confesso que nestes meses todos já nos afeiçoamos. Já me conhecem de vista, me reconhecem, e quando passam me cumprimentam, como se eu fosse um cliente regular do que vendem.
Tenho pensado muito neles. Quantos conseguirão sobreviver, em função do isolamento social que a pandemia está nos obrigando?
Aquela venda brigada é a única fonte de renda que possuem.Vivem da mão para a boca levando pouco dinheiro para suas famílias.
Confesso meu arrependimento por não ter comprado com mais frequência os produtos que oferecem. Não chega a ser um grande sentimento de culpa, mas, no momento, me sentiria menos injusto.
O nosso blog hoje traz uma crônica doída, um desabafo, um aceno solidário aos meus novos conhecidos de viagem e trajetória.
Se você apreciou minhas palavras, obrigado. Se puder compartilhar nas suas redes sociais, terá valido a pena ter escrito este testemunho.
Ou, “me pague um real”.